Em Dallas dos anos 1980, em meio à expansão silenciosa de uma epidemia ignorada, um homem improvável desafiou os limites da própria intolerância e enfrentou um sistema que preferia fechar os olhos enquanto as vidas se esvaíram.
Um diagnóstico que muda tudo
Ron Woodroof, um eletricista texano, vive uma rotina de rodeios e preconceitos até receber um diagnóstico inesperado: HIV positivo. Em plena década de 1980, quando a doença ainda era cercada de desinformação e estigma, especialmente em comunidades conservadoras, o impacto vai além da saúde — é social, emocional e identitário.
Ao ser confrontado com a própria vulnerabilidade, Ron descobre que seu tempo é curto e que o sistema de saúde não oferece as respostas de que precisa. Os tratamentos disponíveis são escassos, experimentais ou inacessíveis, e os pacientes enfrentam mais barreiras legais e sociais do que apoio efetivo.
O preconceito dentro e fora
Naquele período, o HIV era associado a grupos marginalizados, como pessoas LGBTQIA+ e usuários de drogas. Ron, que carregava visões conservadoras e homofóbicas, se vê de repente do “outro lado” — vítima do mesmo preconceito que antes alimentava.
Essa virada força uma transformação não só física, mas também interna. A convivência com outros pacientes e a urgência da sobrevivência o fazem repensar suas atitudes. A mudança de perspectiva não acontece de forma imediata, mas se revela em pequenos gestos e novas alianças.
Burocracia versus urgência
O filme retrata um sistema de saúde engessado, onde leis rígidas e processos lentos impedem a chegada de medicamentos que poderiam salvar vidas. Mesmo quando há opções eficazes em outros países, os pacientes nos EUA esbarram na morosidade institucional.
Essa realidade empurra Ron para a ilegalidade: ele começa a importar remédios por conta própria, contornando a legislação. A atitude não parte de um desejo de lucro, mas de sobrevivência — sua e de outros pacientes que encontra pelo caminho.
O surgimento do clube
Com o tempo, Ron estrutura um modelo alternativo de acesso: um “clube de compras” no qual os associados não compram diretamente os medicamentos, mas pagam uma taxa para recebê-los. Uma estratégia criativa e arriscada que logo se torna vital para muitos.
Esse clube clandestino se transforma em rede de acolhimento e resistência. Mais do que distribuir remédios, promove troca de informações, apoio mútuo e sentimento de pertencimento entre pessoas que, até então, estavam invisíveis aos olhos da sociedade.
Uma amizade transformadora
Rayon, uma mulher trans também portadora do HIV, torna-se a principal parceira de Ron no clube. A relação entre os dois é, a princípio, tensa — marcada por desconfianças e preconceitos. Mas, com o tempo, se transforma em uma amizade genuína.
Rayon humaniza ainda mais a jornada de Ron. A convivência com ela o obriga a abandonar visões antigas e a entender que empatia e solidariedade são forças transformadoras. Juntos, eles desafiam tanto o sistema quanto o senso comum.
Entre a legalidade e a moralidade
As autoridades de saúde tentam interromper o funcionamento do clube, argumentando que ele desrespeita as normas e coloca os pacientes em risco. Mas o filme questiona: o que realmente coloca essas vidas em perigo — os medicamentos importados ou a falta de alternativas?
A disputa entre o clube e as instituições revela um conflito profundo entre a letra da lei e o valor da vida. Ron não é apresentado como um herói clássico, mas como alguém que se recusa a aceitar a indiferença como resposta.
Reflexos que ainda ecoam
Hoje, muito se avançou no tratamento do HIV, com acesso gratuito a medicamentos em diversos países e campanhas de conscientização. Ainda assim, o estigma não desapareceu completamente, e a negligência com populações vulneráveis continua sendo um problema.
O filme nos lembra que mudanças reais muitas vezes começam com atitudes individuais — especialmente quando o sistema falha. A história de Ron é, acima de tudo, um chamado à empatia, à ação coletiva e à defesa do direito à saúde com dignidade.