Documentário da Netflix investiga terapias alternativas e revela as contradições de um mercado bilionário.
Nos últimos anos, o discurso do bem-estar se tornou onipresente: promessas de cura natural, práticas milenares redescobertas, suplementos, rituais e influenciadores digitais que pregam uma vida mais “limpa”, “equilibrada” e “espiritualizada”. Mas por trás dessa estética de saúde, o que realmente funciona? E o que apenas vende?
Essas são as perguntas centrais da série A Indústria da Cura ([Un]Well), lançada pela Netflix em 2020. Em seis episódios, a produção dirigida por Danni Mynard e Leslie Asako Gladsjo mergulha no universo das terapias alternativas — de óleos essenciais e sexo tântrico a jejum intermitente, ayahuasca e veneno de abelha — revelando um cenário tão diverso quanto controverso
O Bem-Estar em Debate
Com um formato documental, a série se destaca por dar espaço a múltiplas vozes: praticantes, usuários, críticos, médicos e estudiosos de diferentes partes do mundo. A abordagem equilibrada tenta fugir dos extremos — tanto do ceticismo total quanto da fé cega — para investigar o que há de fato, de mito e de perigo nas práticas analisadas.
Cada episódio foca em uma prática específica e expõe seus usos, origens, argumentos de defesa e críticas. Por exemplo, o episódio sobre ayahuasca explora tanto o uso tradicional da substância em rituais indígenas no Peru quanto sua apropriação por centros urbanos ocidentais, nem sempre com os mesmos cuidados e significados culturais. Já no capítulo sobre leite materno, a série questiona os limites do consumo humano adulto e os impactos éticos de sua comercialização.
Um Mercado Trilhão de Dólares
Ao longo dos episódios, uma pergunta se repete como mantra: “Se essas práticas prometem tanto, por que muitas delas ainda carecem de comprovação científica?” A resposta, muitas vezes, aponta para o marketing — e para um mercado global de terapias e suplementos alternativos que movimenta trilhões de dólares anualmente.
A Indústria da Cura também escancara o uso de pseudociência como estratégia de venda. Promessas milagrosas, linguagem científica sem base empírica e a construção de autoridade por meio de “especialistas” não reconhecidos são práticas recorrentes nesse universo.
Saúde, Desigualdade e Informação
Além do viés investigativo, a série levanta questões sociais profundas sobre quem tem acesso a práticas de bem-estar e quais grupos são mais vulneráveis a discursos pseudocientíficos. As respostas estão entrelaçadas com temas como desigualdade de acesso à saúde (ODS 10), educação científica (ODS 4) e responsabilidade com o bem-estar coletivo (ODS 3).
A série também mostra que, em contextos onde os sistemas de saúde são inacessíveis ou falhos, muitas pessoas recorrem às terapias alternativas como única opção. Isso amplia o debate sobre a necessidade de educação crítica sobre saúde e a importância de políticas públicas que combatam a desinformação.
Cura ou Conveniência?
A Indústria da Cura não pretende deslegitimar todas as práticas alternativas, mas sim expor seus riscos quando praticadas sem critérios, regulação ou respaldo científico. Ao equilibrar fé, ciência, cultura e mercado, a série convida o espectador a refletir se estão buscando cura ou comprando conveniência.